quarta-feira, 3 de março de 2010

Michael Jackson: É hora da mídia assumir a responsabilidade na cobertura sobre o astro

Semana passada a guitarrista de Michael Jackson desacreditou abertamente as alegações sobre o comportamento do astro durante as turnês. Então por que a mídia recusa-se a publicar seus comentários? O escritor britânico Charles Thomson fala sobre o preconceito da mídia contra o maior artista da black music.

O envelhecido roqueiro Gene Simmons dominou as manchetes internacionais no mês passado quando declarou que sabia que Michael Jackson molestava crianças. Em uma entrevista à Classic Rock, Simmons alegou que Jackson foi filmado pedindo bebida alcólica para dar a crianças, e que durante o julgamento do artista em 2005 uma agência de viagens testemunhou que importava meninos brasileiros para a diversão de Jackson. Ele também declarou que um músico seu amigo pedira demissão da turnê após ver “meninos saindo de seu quarto de hotel.”

O que se seguiu foi um exemplo clássico de jornalismo “copiar e colar”. Em questão de horas a história se replicou por centenas de blogs, fóruns e sites de notícias, da Austrália à Índia e Estados Unidos. Nenhum deles havia de fato verificado a história antes de a passarem adiante. Jackson nunca foi filmado servindo bebida alcólica a crianças. Nunca houve nenhum testemunho durante o julgamento referente a meninos brasileiros. Ambas declarações foram facilmente provadas como não constantes das transcrições do julgamento.

Na qualidade de relativamente especialista em Jackson, eu também nunca soube de nenhum músico deixando as turnês do artista depois de seu começo. Assim, quando sentei há duas semanas para uma entrevista com a guitarrista de longa data de Jackson, Jennifer Batten, repassei a história com ela.

Ela me contou que nenhum músico jamais demitiu-se de uma turnê de Jackson. Dois músicos foram despedidos mas isso aconteceu antes da turnê começar, então eles nunca poderiam ter testemunhado nada no inteiror dos hotéis.

Quando a Sawf News publicou a réplica de Batten eu observei um fenômeno bem familiar. Ainda que a história tenha aparecido no Google News e tenha sido coletada rapidamente pelo Examiner, ninguém mais pareceu querer encostar nela. Enquanto as especulações sem base nenhuma em fatos tenham sido replicadas por todo o globo, a réplica baseada em fatos verdadeiros de Batten foi amplamente suprimida.

Eu logo comecei a receber emails de fãs de Jackson me dizendo que eles estavam repassando a história para cada site de notícias de celebridades de que pudessem lembrar, incluindo vários daqueles que publicaram as alegações iniciais de Simmons.

Porém mais de 48 horas depois, ao digitar a frase exata proferida por Simmons em sua declaração, em um site de pesquisa, o resultado produziu quase 350 páginas. O número de sites de notícias com a resposta de Batten? Três.

Essa não foi a primeira vez que vi uma história sobre Jackson ser abafada. Após o suicídio de Chandler em novembro de 2009 eu fui contatado pelo The Sun e me pediram para fornecer informações sobre as alegações de 1993. Eu gastei um bom tempo organizando minha pesquisa, alertando àquele jornal sobre os mitos comuns a esta notícia e como evitá-los, tomando cuidado de listar todas as fontes consultadas por mim, de documentos legais a evidências de áudio e vídeo.

Quando li o artigo pronto fiquei pasmo ao descobrir que toda a minha informação foi descartada e substituída pelos mesmos mitos sobre os quais eu havia avisado que evitassem. Eu alertei a equipe sobre as imprecisões mas meus emails nunca tiveram resposta. Essas mesmas imprecisões apareceram em cada artigo que eu li sobre o suicídio.

O mesmo preconceito se manifestou durante o mês seguinte quando os arquivos do FBI sobre Jackson foram liberados. Por mais de 300 páginas de informações não se encontrava uma evidência encriminadora sequer – mas não foi assim que a mídia contou essa história.

Uma fita de video apreendida na alfândega em West Palm Beach, e constatada como contendo pornografia infantil, foi repetidamente referida como pertencente a Jackson. Na verdade, tudo que os arquivos diziam era que a fita estava “ligada” a Jackson, e essa ligação consistia simplesmente no fato de que alguém escrevera seu nome na etiqueta adesiva da fita.

Em outro documento o FBI refere-se a uma ligação telefônica de uma fonte anônima declarando que aquele departamento havia investigado Jackson durante os anos 80, por abuso sexual a dois meninos mexicanos. Os arquivos não fizeram nenhuma outra menção a estas supostas investigações e o pedido foi considerado inválido – a ligação telefônica foi meramente notada. Mas a mídia referiu-se persistentemente a essas declarações não comprovadas de uma fonte anônima, como sendo as conclusões do próprio FBI sobre o assunto.

Os arquivos do FBI sobre Jackson mostravam intensa e claramente sua inocência, mas seu conteúdo foi rotineiramente manipulado para passar a impressão oposta.

Muitos são rápidos no desprezo quando os fãs de Jackson falam à imprensa sobre conspiração da mídia para destruir a reputação do artista, e eu costumava fazer isso também. Como membro dessa indústria eu prefiro não pensar nisso como algo sinistro ou conspiratório, mas acho incrivelmente difícil explicar o preconceito com o qual Jackson é tratado.

Me pergunto se o problema não é o orgulho. Quando as alegações de 1993 estouraram, a vasta maioria da informação disponível foi divulgada, oficialmente ou não, pela promotoria. Jackson, enquanto isso, permaneceu em silêncio como de costume.

Talvez pelo fato de que a versão dos fatos prestada pela promotoria encontrava-se quase que completamente incontestada (embora eu imagine que drama e venda de jornais tiveram algo a ver com isto, também), a mídia escolheu primeiramente retratar Jackson como culpado.

Mas assim que os fatos começaram a se esclarecer, tornou-se bem evidente que o caso estava cheio de buracos. As alegações foram instigadas não pelo menino, mas por seu pai, que exigira de Jackson um acordo para roteiros de cinema, antes de se dirigir à polícia. Sua voz estava gravada em fita, planejando a destruição da carreira de Jackson e descartando o bem-estar de seu filho, como “irrelevante.” Depois disso o menino contou aos policiais que Jackson era cincuncidado, mas a perícia ao corpo de Jackson levou à conclusão de que ele não era.

Muito embora a inocência de Jackson parecesse cada vez mais provável, a maioria dos sites de notícias já haviam feito seu julgamento, e até hoje essa decisão continua sendo a mesma.

Seja qual for a motivação, orgulho, lucro ou apenas o velho racismo, o preconceito contra Jackson é inegável. A supressão dos comentários de Batten prova mais uma vez que quando se trata de Jackson a mídia não está interessada na verdade ou na razão, mas sim em negatividade e sensacionalismo. Batten acompanhou Jackson em três de suas turnês mundiais e ficou conhecida por uma década como sua “mão direita”. Mas Simmons – que confessou não conhecer Jackson – teve 100 vezes mais cobertura da mídia em cima de seus comentários irresponsáveis do que Batten, que possui experiência de primeira mão.

Chegou a hora dos meios de comunicação assumirem responsabilidade pelo conteúdo que publicam. Sites não deveriam reproduzir histórias de outros lugares a menos que tenham certeza de que a informação é verídica. Ainda que a mídia se recuse a publicar a verdade sobre Jackson, deveria se comprometer a também não publicar mentiras. Ao menos assim ele poderá descansar em paz.

Fonte:
http://www.huffingtonpost.com/charles-thomson/michael-jackson-its-time_b_482176.html?ref=fb

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